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Sadatoshi Imazu: o elo entre história e futuro
Aos 84 anos de idade, Imazu relembra as dificuldades que enfrentou como imigrante e fala sobre a preservação da cultura japonesa para as novas gerações
Foto: Monami Takaoka
Em 2016, Sadatoshi Imazu, 84, comemora sessenta anos bem sucedidos de sua oficina auto elétrica, em Rolândia. A clientela fiel, acostumada a ver o senhor “enrolando motor” (como ele mesmo diz) e falando um português de sotaque nipônico, não deve ter dúvidas de que este é um homem que gosta do que faz. E com razão: mesmo aos domingos, vez ou outra, o aposentado empresta algumas horas do dia para sujar as mãos de óleo.
Mas o que ainda não fica explícito para muitos é que Imazu éhistória viva da imigração japonesa no Brasil.
Imazu conta que veio para o Brasil em outubro de 1933, com um ano e oito meses de idade. A família de oito pessoas decidiu deixar a terra natal por incentivo do governo japonês, porque, durante as décadas de vinte e trinta, o Japão ainda enfrentava crise econômica e social.
Estátua dos Imigrantes no Museu Agrícola da Colonização do Paraná, em Rolândia.
Foto: Monami Takaoka
Interior da réplica de uma típica moradia imigrante do século XX. O local é aberto à visitação no Museu Agrícola da Colonização do Paraná, em Rolândia. Foto: Monami Takaoka.
Interior da réplica de uma típica moradia imigrante do século XX. O local é aberto à visitação no Museu Agrícola da Colonização do Paraná, em Rolândia. Foto: Monami Takaoka
E esses problemas se agravaram durante a Segunda Guerra Mundial. Entre 1939 e 1945, os países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão) estiveram em guerra contra os países Aliados (Estados Unidos, União Soviética e Reino Unido). Em 1942, sob governo de Getúlio Vargas, o Brasil declarou guerra contra o Eixo devido a ataques a embarcações brasileiras, atribuídos à Alemanha. A partir dessa decisão, os consulados japoneses no Brasil foram fechados. E o cerceamento à liberdade desses imigrantes se acirrou: proibiu-se toda comunicação em língua japonesa – tanto na convivência cotidiana, quanto nos meios impressos e radiofônicos. Quaisquer reuniões e concentrações de japoneses só podiam ser realizadas na cladestinidade.
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Imazu recorda que esse foi um período especialmente difícil. Ele, que não falava português até os sete anos de idade, revela que o preconceito era presente, inclusive, entre as crianças. Na Escola Mista de Pirianito, onde estudou até o 3º ano, era alvo de xingamentos, aos quais não podia reagir porque corria o risco de sofrer represálias ainda piores - a família podia até ser chamada na delegacia. Diploma não tem, porque fora proibido para estrangeiros. Ele se lembra também de que, várias vezes, seu pai saía para fazer compras e voltava para casa dias depois. As prisões arbitrárias e o confisco de bens eram correntes à época. Imazu destaca, ainda, que não apenas os japoneses, mas os italianos e alemães também sofreram perseguição nesse período. “Guerra deixa todo mundo louco”, diz.
Atualmente, Imazu acredita que o preconceito não existe mais. Entre os motivos que explicam a integração dos japoneses à sociedade brasileira, ele cita como exemplo os casamentos de nikkeiscom outras etnias.
A preocupação, agora, é com a preservação da cultura japonesa. “Costume bom não pode perder, tem que preservar”, salienta.
Museu Agrícola da Colonização do Paraná:
pela conscientização das novas gerações
Foto: Monami Takaoka
"Kaitaku Jinja": santuário xintoísta no Museu Japonês, em Rolândia.
Foto: Monami Takaoka
A construção, planejada desde 1975, localiza-se no km 5 da estrada Rolândia/Pitangueiras. Ao longo dos quase quarenta anos de existência, figuras de renome passaram pelo local. Em 1978, na inauguração de parte do museu, o príncipe herdeiro Naruhito, do Japão, e Ernesto Geisel, presidente do Brasil à época, estiveram presentes. E, a cada dez anos, em comemoração à chegada dos imigrantes ao solo brasileiro, o museu tem recebido membros dos governos brasileiro e japonês. Entre eles, o ex-presidente José Sarney (1985-1990), o ex-vice-presidente José Alencar (2003-2010) e o príncipe japonês Akishino (segundo na linha de sucessão ao Trono do Crisântemo do Japão).
→ Mais recentemente, em outubro de 2015, o casal imperial japonês, príncipe Akishino e princesa Kiko, visitaram Rolândia e outras cidades no país, para celebração dos 120 anos do Tratado de Amizade entre Brasil e Japão.
Mas toda essa atenção recebida do governo fica restrita às datas comemorativas. Em todos os outros dias, o museu fica sob tutela de um pequeno grupo de pessoas.
Sadatoshi Imazu, 84, cuida do Museu Japonês há mais de 30 anos. Foto: Monami Takaoka
Interior do Museu Japonês de Rolândia. Foto: Monami Takaoka
Objetos em exposição no Museu Japonês de Rolândia. Foto: Monami Takaoka
Entre os problemas enfrentados, Imazu ressalta a questão do público frequentador. Por trinta anos, ele esteve diariamente no museu. Mas, nos últimos quatro anos, a presença de usuários de drogas no local tem causado problemas. É por isso que, hoje, as visitas devem ser agendadas e o museu não fica aberto em tempo integral. Imazu contabiliza cerca de mil visitantes por ano, sendo a maioria crianças em visitas escolares – que não pagam entrada. Aos pagantes, o valor é de dois reais.
No dia 7 de novembro de 2011, Sadatoshi Imazu,84, recebeu o Título de Cidadão Honorário de Rolândia, pelos serviços prestados ao município. Foto: Monami Takaoka
Foto: Monami Takaoka
Todos os anos, próximo ao dia 18 de junho, o museu realiza a Missa do Pioneiro, em memória aos primeiros imigrantes que atracaram no porto de Santos.
“Para nós, é um dia que não pode esquecer”, diz.
→ Em 18/06/1908, o navio Kasato Maru chegou ao Brasil trazendo os primeiros imigrantes japoneses.
* Esse post inaugura a série "Cultura Japonesa: um fotodocumentário" e foi adaptado de um trabalho produzido para a disciplina de Fotojornalismo da UEL.
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